Se já é difícil provar a existência de uma guerra cambial, o que dirá uma trégua cambial. Esse tipo de informação não sai em relatórios de autoridades monetárias, mas são obviamente discutidas calorosamente, a portas fechadas, em reuniões de lideranças políticas e de banqueiros centrais.
O câmbio é uma ferramenta extremamente importante
não somente para defesa, mas também para o perfeito funcionamento e desenvolvimento
de qualquer economia. Choques ou distorções no mercado cambial se tornaram mais
freqüentes desde o estouro da crise financeira em 2008, num mundo instável onde
a demanda carente não consegue suprir o excesso de oferta.
Volta e meia bancos centrais recorrem a formas
de intervenções no mercado de câmbio (direta ou indireta) para se
defenderem de um ciclo de deterioração dos fundamentos domésticos. Isso tem
sido freqüente desde 2008, mas nos últimos anos a situação se abrandou
com a valorização do dólar frente as demais moedas.
Entretanto, a sensação de trégua parece estar
ameaçada. O FED (Federal Reserve – Banco Central dos Estados Unidos) deu o seu
berro no mercado, incomodado com a forte valorização do dólar em 2014 e 2015.
Desde então, a autoridade monetária norte-americana passou a usar uma postura
ainda mais cautelosa na implementação da política monetária, revertendo a
trajetória de valorização do dólar frente as demais moedas.
Consequentemente, países que haviam se
beneficiado (via exportações) com a desvalorização de suas respectivas moedas,
voltaram a passar aperto com a mudança na trajetória do dólar. O ambiente no
mercado externo ficou mais tenso. O acordo informal pareceu ter sido quebrado,
o que forçou alguns bancos centrais a partirem para o enfrentamento, afrouxando
ainda mais suas políticas monetárias.
Juros baixos ou negativos normalmente forçam
desvalorizações de moedas locais, o que impulsiona as exportações e colabora na
promoção de uma inflação mais alta (via aumento de preço dos produtos
importados).
O problema é que, desta vez, a estratégia de
enfrentamento não funcionou. Europa e Japão, por exemplo, operam juros
negativos, e mesmo assim suas respectivas moedas continuaram se valorizando.
Isso ocorre em função da parte responsável pelo
contrapeso. Para que alguma moeda se desvalorize, “alguém” tem que se
valorizar. Até pouco tempo atrás, a economia norte-americana assumia esse
papel. Mas o crescimento dos Estados Unidos não está vingando com força
suficiente capaz de carregar o dólar forte contra as demais moedas.
Percebendo esse novo quadro, alguns bancos
centrais já estão adotando medidas de impacto cambial (até porque não existem
outras opções), ameaçando a trégua. Nesta semana, o Banco Central da China
reduziu em quase 0,60% o nível de referência do yuan frente ao dólar, queda
mais expressiva desde a desvalorização de agosto de 2015.
No Japão, o primeiro-ministro, Shinzo Abe,
afirmou ontem que o país vai adotar “ações apropriadas contra a alta excessiva
e especulativa do iene”, que, segundo ele, está prejudicando as companhias japonesas
dependentes de exportações.
Também nesta semana, o Banco Central da
Austrália cortou de forma surpreendente a taxa básica de juros em 0,25 p.p.,
para 1,75% ao ano (mínima histórica), numa tentativa de lidar com a inflação
mais baixa e recente valorização da moeda local.
Na Rússia, já se especula que o Banco Central
fará intervenções no mercado para vender rublos no intuito de frear o avanço da
moeda local. Depois do real, o rublo é a moeda de mercado emergente com melhor
desempenho neste ano.
No Brasil, o movimento de intervenções já está
em curso, com o Banco Central operando no mercado cambial de forma mais tática
e menos previsível, na tentativa de fazer o possível para frear o avanço do
real.
A ata da última reunião do Copom (Comitê de
Política Monetária) divulgada ontem também denuncia esse novo posicionamento
tático da autoridade monetária, com foco no mercado de câmbio. A mensagem foi
mais dura do que o esperado, não trazendo qualquer indicação de quando se
iniciará o ciclo de afrouxamento monetário.
Assim, o Banco Central joga agora para fazer o
possível para atrasar o processo de precificação de queda dos juros no mercado,
e, portanto, tentar segurar por algum tempo o ritmo de valorização do real. Diferentemente
do início deste ano, o Banco Central não precisa, neste momento, de um clima
tão otimista no mercado.
Até o momento, o mercado tem colaborado para
estratégia do Banco Central. Com o mundo mais focado nos deslocamentos das
moedas, as bolsas de valores se tornam mais sensíveis às notícias e ações de
defesa das autoridades monetárias.
O índice Bovespa permanece vendido, realizando
teste na primeira linha de suporte localizada na faixa dos 51,7k.
O dólar contra cesta de moedas emplacou nesta
sexta-feira a quarta alta consecutiva, num movimento de recuperação relevante,
iniciado pela indicação clássica de um martelo na linha inferior de bollinger
num mercado sobrevendido. Esse movimento técnico reflete as recentes medidas e
atuações de banqueiros centrais no mercado de câmbio.
Caso
a recuperação do dólar ganhe força nas próximas semanas/meses, o FED deverá
contra atacá-la em seus comunicados ao mercado, já que a economia
norte-americana ainda não está pronta para suportar uma renovação da máxima de sua moeda atingida em 2015. Portanto, existe espaço para certa valorização do dólar, mas
não tão abrangente quanto aos anos anteriores.
"não trazendo qualquer indicação de quando se iniciará o ciclo de aperto monetário.". Não seria alívio monetário?
ResponderExcluirOpa, sim. Está errado no post. Vou corrigir, obrigado!
ExcluirAbs, bons negócios